plural

PLURAL: os textos de Juliana Petermann e Eni Celidonio



(Empatia para home office com crianças
Juliana Petermann 
Professora universitária

style="width: 25%; float: right;" data-filename="retriever">

À espera da vacina - e passando raiva com as atrocidades do governo nas suas medidas de incentivo à pandemia - eis que lá vem se aproximando, mais um semestre de home office. Sim, eu sei que estar em home office, nesse contexto, é um privilégio, uma segurança. Em uma primeira impressão, alguém já diz: que bom é não sair de casa para nada. PARA NADA. É aí que o que parecia ser um benefício vai se convertendo em monotonia, apatia, tédio? Não exatamente. Especialmente, para quem está em home office com as crianças.

UM GUIA

Na última semana - a sobrecarga de trabalho do final do semestre, somada ao cuidado com um bebê, em isolamento social, sem rede de apoio, num contexto social, econômico e sanitário trágico e num contexto político cansativo e ultrajante - ao iniciar um turno de trabalho às 22h, depois de colocar meu bebê no berço, pensei que um guia seria importante. Aí vai ele:

COLEGA

1) Releve áudios com choros, gritinhos e se delicie com as risadinhas. Além disso, podem ser interrompidos ou acompanhados de "peraí que (nome da criança) está se aproximando da tomada". Não estranhe o fundo musical: músicas de bom dia, parabéns ou fazendinhas repetidas infinitamente. Áudios sussurrados significam que o bebê dormiu e que pai correu para um lado, mãe para outro, tentando fazer um milhão de coisas em 40 minutos.

2) Lembre-se: agendar uma reunião é um malabarismo. Um bebê depende dos pais para sobreviver. Não há nada que possam fazer sem supervisão. No home office ou um cuida, ou o outro cuida. Então, quando um tem reunião de manhã e de tarde, o outro consegue trabalhar um total de zero horas.

3) Tenha noção dos prazos: uma tarefa que seria realizada em uma hora, pode levar até dez horas. Embora se faça milagres trabalhando com foco total a cada soneca, às vezes elas não duram nem o suficiente para ligar o computador.

4) Nos encontros virtuais, tenha objetividade. Embora estejamos com saudades, lembre que um bebê espera e que alguém aguarda a troca de turno para dar conta do seu trabalho.

5) Palestra, reunião, aula, entrevista: qualquer compromisso pode ser interrompido pela entrada triunfal de um bebezão na câmera. E, embora todo mundo se derreta do outro lado da tela, é possível que alguém estivesse precisando ir ao banheiro, por exemplo.

6) Tenha compreensão. Eu sei que estamos vivendo um período em que cada casa é uma história, mas também sei que um pouco de compreensão ajuda muito e para compreender é preciso conhecer. Esse guia é para isso também.   


Alfredo (2)
Eni Celidonio 
Professora universitária

style="width: 25%; float: right;" data-filename="retriever">Geral me preguntando quem é Alfredo, se o lance que contei é verdade. Pois senhores, não só é verdade como é muito pior do que eu contei. Quem é Alfredo eu não conto, nem sob tortura, nos porões do CENIMAR. Mas Alfredo existe? Existe, com outro nome. Qual o nome de verdade? Que gente mais curiosa, eu contei a história, que pode ser do João, do Antônio ou do Joaquim, ora bolas! Vocês querem saber do que mais? Pois então vou contar outra do Alfredo.

O PIANISTA

Um belo dia, almoçávamos numa churrascaria, e Alfredo nos perguntou se havia na nossa vizinhança algum músico ou coisa que o valha. Todos respondemos que não. Ele, então, nos disse que havia no seu prédio alguém que tocava no piano uma música que ele amava, do Steve Wonder, e começou e cantarolar, e nenhum de nós foi capaz de identificar qual era a canção. Parecia aqueles lances de programa de auditório, ou do Faustão, que o sujeito precisa adivinhar a música através de acordes, com uma diferença: nos programas, os acordes eram afinados, já o Alfredo...

Saímos todos pensando que música seria essa que deixava o nosso amigo tão curioso, loucos para saber quem era o sujeito que tocava sua canção preferida. E o tempo foi passando.

Eis que encontramos Alfredo novamente, enlouquecido, porque disse que parecia mentira, mas o músico também tinha um piano perto do escritório dele, porque ele jurava por todos os santos que tinha ouvido a canção, perguntou ao porteiro do prédio se havia alguma sala alugada para um músico, e a resposta foi negativa. E o mistério continuava...

Então tá: Deus e o músico do Alfredo eram onipresentes, estavam em todos os lugares... Tempos depois, a gente até já tinha esquecido da história do mistério do Alfredo, quando fomos numa pizzaria com música ambiente e tocou a tal da canção. Alfredo, numa alegria de colorado no Campeonato Brasileiro, começou a gritar: "É essa! É essa"! E descobrimos que a música, que tanto tinha nos tirado o sono, era I just call to say I love you. Pronto! Estava descoberto o mistério da música, só faltava descobrir o mistério do músico...

A DESCOBERTA

Então fomos passar o Ano Novo na praia, aproveitamos o recesso e chegamos uns três dias antes. Um calor que Deus mandava, saímos num grupo enorme para tomar umas cervejas e jantar num restaurante. E de repente, não mais que de repente, Alfredo arregala os olhos e nos diz: "Mas não é possível! Até aqui na praia esse sujeito me persegue! Apurem os ouvidos! Vocês também estão ouvindo?"...

Nós nos entreolhamos e começamos a rir, dar gargalhadas e Alfredo, entre constrangido e raivoso, comentou: "Estão rindo de quê? Que palhaçada é essa"? Não lembro quem foi, mas alguém na mesa, entre gargalhadas respondeu: - Mas Alfredo! A gente pensando nisso há mais de um ano! Pelo amor de Deus! Essa música toca no Sul todo... Isso é o caminhão do gás!



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